Ver-te é existir mais um bocadinho.
Mas esse bocadinho é tão pouco
Que a pouco me sabe
Na sofreguidão dos dias
que em mim se prolongam.
É tão pouco e em ti há tanto
Mistério para desvendar
E nesta imensa solidão de corpos
De almas perdidas
somos apenas enigmas
que por aí navegam
E nem Santo Agostinho
Foi capaz de explicar.
Desvenda-me o olhar
E que os nossos olhares se cruzem
E se prolonguem
Num vislumbrar do Belo
Para que Eros não tarde em chegar.
Mal Eros sabe
Que já fomos sonhos
E projetos a dois
Mas a vida não era um carro de bois
E nós viajámos
Sem identidade
Sem rosto
Sem idade
Perdidos
Num grande alvoroço
Mas com tamanha felicidade.
Foi neste belo esboço
Em que os sorrisos que não se esboçaram
Apenas numa memória
ficaram.
E a memória… essa traiçoeira…
Sonho, imaginação, realidade?
E o que tem?
Se a memória engana
E mal se consegue vislumbrar o passado
Pois que seja o que cada um quiser
Aquilo que (jamais?) foi vivenciado.
E que assim se saiba que as paixões que enganam são as melhores
Porque o amor dessas muito tem de superficial
Mas a dor… essa…
É sempre real.
E o real é o que nos faz
Existir
mais um bocadinho.